O brasileiro Alexandre Lopes, que dá aula para crianças especiais na Carol City Elementary, na Flórida
(Foto: Reprodução/Macys's)
Um brasileiro de 43 anos, natural de
Petrópolis,
no Rio de Janeiro, foi eleito na última quinta-feira (12) o melhor
entre os mais de 180 mil professores da rede estadual de ensino da
Flórida, nos Estados Unidos. Além de prêmios em dinheiro, um carro, uma
viagem a Nova York, um anel de ouro e um treinamento espacial na Nasa,
Alexandre Lopes, que emigrou do Brasil em 1995, agora é candidato ao
título de melhor professor dos Estados Unidos.
A etapa nacional da disputa fica aos cuidados do Departamento Nacional
de Educação do governo federal. Lopes já tem presença garantida no
evento de divulgação do resultado, em maio de 2013 na Casa Branca, em
Washington, com a presença do presidente americano.
Até lá, ele vai viajar pelo estado onde mora dando palestras para
outros professores sobre sua metodologia na sala de aula. Doutorando da
Universidade Internacional da Flórida, ele se especializou na educação
especial para a primeira infância e, há oito anos, trabalha na escola
Carol City Elementary, em
Miami.
O brasileiro leciona para dois grupos de 12 e 13 crianças com idades de três a cinco anos, na idade considerada nos
Estados Unidos
como pré-escolar. Parte dos alunos é autista e, como a Carol City
Elementary fica em uma região de baixo poder aquisitivo, a maioria dos
estudantes pertence a minorias dentro da sociedade americana. Alguns
ainda são filhos de imigrantes e não têm o inglês como idioma nativo.
É uma inclusão total e irrestrita, da maneira que eu gosto, com alunos
deficientes, imigrantes, minorias... Como eu acho que a sociedade
deveria ser"
Alexandre Lopes, eleito o
melhor professor da Flórida
"É uma inclusão total e irrestrita, da maneira que eu gosto, com alunos
deficientes, imigrantes, minorias... Como eu acho que a sociedade
deveria ser", conta. Lopes considera sua abordagem "holística" e afirma
que se envolve em todos os aspectos da vida de seus "aluninhos", como
gosta de se referir às crianças que ensina, tanto da parte acadêmica
quanto da emocional e da social. Para o brasileiro, isso significa
incluir todos os membros mais próximos da família no processo escolar,
muitos deles ainda se adaptando à notícia de que seus filhos são
autistas.
Aceitando a diversidade
Na sala de aula do brasileiro, porém, todos são iguais. "Eu não
diferencio meus alunos. Procuro ser consistente para fazer com que meus
alunos com autismo tenham os outros como modelo, e para fazer com que
meus outros alunos aceitem todas as diferenças que existem na nossa
sociedade", explica Alex, como é conhecido pelos alunos e colegas de
trabalho. Suas técnicas variam de acordo com o conteúdo das aulas.
Segundo ele, música e dança são dois elementos que predominam durante as
atividades, mas a adoção da tecnologia também ajuda os pequenos
estudantes a se expressarem.
Entre os equipamentos está uma tela que reproduz, ao toque de um botão,
mensagens pré-gravadas na voz dele ou de um estudante. O instrumento é
usado pelos alunos autistas para que eles possam comunicar o
reconhecimento dos símbolos, um processo que, segundo Lopes, acontece
nestas crianças de maneira diferente das demais.
Lopes
usa tecnologia, instrumentos e música para transmitir conhecimentos a
crianças de três a cinco anos (Foto: Reprodução/Macys's)
Para aprender a construir palavras, os aluninhos usam blocos de madeira
que representam cada letra e os unem e separam para formar sílabas,
sempre atentos aos sons das palavras para compreender a relação entre as
rimas e a formação das palavras com grafia parecida. "Isso serve para
tirar a palavra do abstrato e torná-la uma coisa concreta, o que é muito
importante para crianças com deficiência", explica.
Alexandre também digitaliza as páginas de livros, ocultando as frases
escritas para reescrever a história a partir das imagens de forma
coletva e, assim, conseguir tirar das crianças a linguagem construída
durante as demais atividades.
A imigração, o atentado e a mudança
O início da vida adulta de Lopes não poderia ser mais distante de seu
cotidiano atual, trabalhando sete horas por dia, cinco dias por semana,
com um intervalo de 30 minutos para o almoço. No início da década de
1990, o hoje melhor professor da
Flórida
trocava Petrópolis pela capital fluminense para estudar produção
editorial na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Naquela
época, ele havia abandonado o sonho de criança de ser professor, já que
sempre ouvia relatos de como a carreira exigia muito e pagava pouco.
Ele conta que arrumou um emprego na Pan American Airways para pagar o
aluguel no Rio de Janeiro. Depois de formado, o então bacharel se
apaixonou e decidiu se mudar para os Estados Unidos em julho de 1995.
"Mas eu jamais deixei o Brasil. A vida me trouxe aos Estados Unidos, mas
tenho muito orgulho da minha origem e de ser quem sou", diz.
Durante vários anos, Lopes seguiu trabalhando como comissário de bordo
para várias companhias aéreas americanas, onde fazia traduções de
inglês, português e espanhol nas rotas da América Latina. Mesmo com os
benefícios e as muitas viagens que pôde fazer pelo mundo, ele afirma que
sentia falta de estudar. "Eu queria algo que fosse um pouco mais
recompensador, mas era difícil porque tinha que pagar as minhas contas",
lembra.
Jamais deixei o Brasil. A vida me trouxe aos Estados Unidos, mas tenho muito orgulho da minha origem e de ser quem sou"
Alexandre Lopes
Após os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, sua empresa
ofereceu pacotes de benefício a quem aceitasse se afastar do emprego e
abrir mão do salário. Lopes, já com mais de 30 anos de idade, aproveitou
a chance para buscar uma nova formação. Segundo ele, sua ideia original
era se tornar professor de línguas estrangeiras, mas uma conselheira
vocacional sugeriu, além do curso de educação, um curso introdutório em
educação especial na primeira infância.
"Me apaixonei pela área e minha professora se apaixonou pelo meu
trabalho. Ela me recomendou para uma bolsa de mestrado na Universidade
de Miami", explica o professor, que foi aprovado no processo seletivo
com bolsa integral e, assim que completou seus créditos e estágios
obrigatórios, recebeu o convite para iniciar uma turma de educação
inclusiva na Carol City Elementary, onde está desde 2005, com um salário
mais baixo do que recebia quando era comissário de bordo.
Lopes agora equilibra o trabalho com a pesquisa de doutorado na
Universidade Internacional da Flórida, onde também foi selecionado para
estudar com bolsa integral, e o Projeto Rise, uma iniciativa americana
em nível federal que estimula a formação continuada de professores de
escolas com população carente no país.
Alex
foi eleito o melhor professor da Flórida na última quinta-feira (12); à
direita, ele recebe um beijo de seu pai, Enir Lopes, que viajou de
Petrópolis a Miami para a cerimônia (Foto: Reprodução/Macys's)
Eleito entre mais de 180 mil docentes
Durante mais de seis meses, Lopes passou por uma série de longas e
trabalhosas etapas para conquistar o título de melhor professor de toda a
rede estadual da Flórida. O processo começou com uma votação entre os
próprios colegas da escola em que ele trabalha, na região centro-norte
do condado de Miami, o quarto maior dos Estados Unidos, com 25 mil
docentes. Ele então preparou um material por escrito com dezenas de
páginas, no qual explicava sua filosofia educacional, suas motivações e
sua metodologia de ensino.
O documento foi avaliado na sua região e ele foi selecionado como um
dos cinco finalistas, que receberam visitas em suas salas de aula de uma
comissão com 13 examinadores e participaram de entrevistas. Lopes
venceu a disputa e, no início do ano, passou a concorrer ao posto de
melhor professor do condado. O resultado, também favorável ao professor
petropolitano, saiu em fevereiro deste ano, junto com um carro 0 km,
prêmios em dinheiro e uma bolsa de estudos, à qual ele abriu mão por já
ter uma no doutorado.
A etapa estadual, que tem patrocínio da rede de lojas de departamento
Macy's, exigiu novos artigos, visitas à sala de aula e entrevistas, além
do envio de um vídeo apresentando o trabalho na escola e um encontro de
três dias na cidade de Orlando com os mais de 70 professores dos
condados e distritos especiais da Flórida.
Essas crianças são filhas desses indivíduos, mas elas também são parte
da nossa sociedade, é injusto que deixemos esses pais sozinhos com o
grande desafio que enfrentam"
Alexandre Lopes
Na entrevista final, o brasileiro lembrou aos examinadores que, naquele
dia de junho, o planeta Vênus estava transitando em frente ao Sol, um
fenômeno que só se repetirá daqui a um século. "Eu disse a eles que,
quando isso acontecer, eu não vou estar mais aqui, meus aluninhos não
vão estar mais aqui, mas a sociedade ensinada por eles e pelo meu
ensino, sim. Depois disse a mim mesmo: 'que resposta mais tola!' Voltei
para casa achando que não venceria", afirmou.
Lopes estava errado, e seu nome foi anunciado como melhor professor do
estado na última quinta-feira. Assim como as exigências da competição,
as recompensas da etapa estadual também são maiores, e incluíram
surpresas e um prêmio de US$ 5 mil (mais de R$ 10 mil) aos cinco
finalistas, além de US$ 10 mil (mais de US$ 20 mil) ao grande vencedor.
A fama, o dinheiro e as regalias que tem recebido nos últimos meses,
porém, são honras menores para ele. "Eu tive uma vida muito feliz, de
muitas alegrias. Mas as alegrias que eu encontro com o sucesso dos meus
alunos não se comparam com nada que eu já experimentei", afirmou Lopes,
que diz ter uma admiração especial pelos pais de alunos com deficiência.
"Essas crianças são filhas desses indivíduos, mas elas também são parte
da nossa sociedade, é injusto que deixemos esses pais sozinhos com o
grande desafio que enfrentam."